data-filename="retriever" style="width: 100%;">Falando sinceramente, não existe assunto mais interessante na atualidade do que a política. Ainda bem, porque a política é a alma da democracia. Fora dela, não há discussão e os conflitos são resolvidos pela força. É o que acontece nos regimes autoritários que, infelizmente, alguns poucos ignorantes pedem a volta no Brasil. Usando uma licença poética, podemos comparar a política com uma mulher volúvel (lembrei de "La donna è mobile", da ópera Rigoletto, de Verdi). Mas a comparação que mais gosto é a do político mineiro Magalhães Pinto (banqueiro que apoiou o golpe militar) que disse que "política é como nuvem. Você olha e ela está de um jeito. Olha de novo e ela já mudou".
Portanto, na defensiva, ouso dar alguns palpites sobre o atual quadro político e de seus desdobramentos na eleição de 2022. Por exemplo, que efeito terá a CPI da Covid? Difícil dizer ao certo. Até aqui, a CPI avançava mais como um evento midiático com pouco potencial de destruição. Porém, a denúncia do servidor do Ministério da Saúde Luís Ricardo Miranda (sobre indícios de corrupção na importação da vacina indiana Covaxin) e a do seu irmão deputado Luís Miranda (que levou o fato ao conhecimento do presidente) caiu como uma bomba na comissão.
Até agora, a CPI investigava apenas as ações e omissões do governo federal em relação a mais de meio milhão de mortos pela Covid-19. Agora deparou-se com indícios fortes de corrupção entre altos escalões do governo, com o conhecimento do próprio presidente. Este é o caso do líder do governo na Câmara (Ricardo Barros) que estaria por trás de todo esse imbróglio. Atingido em cheio, resta ver como se comportará o chamado "Centrão", do qual Barros é um dos principais representantes. Se a CPI acusar Bolsonaro de prevaricação, seu aliado e presidente da Câmara (Arthur Lira) irá desengavetar os pedidos de impeachment? Por enquanto, é apenas uma hipótese remota, mas se a nuvem mudar de direção...
Não faz muito tempo, Lula estava preso em Curitiba como chefe de uma facção criminosa (PT), no dizer do procurador da República Deltan Dallagnol (coordenador da Lava Jato). Sérgio Moro, o juiz que mandou Lula para a cadeia, era herói nacional. Bolsonaro apropriou-se de um discurso contra a corrupção e levou Moro para ser seu ministro da Justiça. Como o discurso era "para inglês ver", não demorou muito para Moro "pegar o chapéu". Hoje, deixou de ser juiz e voltou para o escritório de advocacia. Condenado pelo STF como juiz parcial no caso Lula, Moro "derreteu" como candidato para 2022.
Mais uma vez, a nuvem se moveu e Lula foi reabilitado. Hoje, não só readquiriu seus direitos políticos como todos os seus processos foram anulados. Caso volte a ser acusado, a Justiça terá de começar do zero. Antes disso, se a eleição presidencial fosse hoje, Lula venceria no primeiro turno com 49% dos votos. Bolsonaro ficaria apenas com 23% do eleitorado. Os dados são do Ipec, instituto que substituiu o Ibope. Na mesma pesquisa, 34% dos eleitores que votaram em Bolsonaro em 2018 disseram que não repetirão o voto. O curioso é que 25% deles agora dizem "com certeza" que votarão em Lula.
Esses são dois extremos do arco eleitoral para 2022. Há quem sonhe com uma candidatura de centro, mas é difícil achar um candidato com densidade de votos. Ciro Gomes (PDT) e João Dória (PSDB) ficaram, respectivamente, com 7% e 5% dos votos, segundo a pesquisa citada. Além do mais, Ciro é egocêntrico por temperamento, o que dificulta os apoios; Dória depende ainda da prévia do partido para sair candidato. Até agora, nenhum deles é "páreo" para Lula ou Bolsonaro, a não ser que a nuvem mude muito.